Fotos e relatos do INÍCIO da ida de CARLOS PARA ROMA (1982)_#228#
30/08/1982
07/09/1982
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DESPEDIDA
Mª Aurora
A data 14-09-82 é de grande significado para nós, pois ela marca o dia da partida do mano CARLOS EDUARDO - Inho, para Roma, onde dará prosseguimento aos estudos teológicos, por um período de 5 a 6 anos,
Tentarei, em poucas palavras, contar como foi a sua despedida, no Aeroporto 2 de Julho. Antes porém, para os manos e cunhados distantes, vale dizer que, no dia 7 de setembro, eu, papai, mãe Ite, os ma nos de Itamaraju e daqui, tivemos a oportunidade de participar do 19 encontro de Seminaristas e seus familiares, no Seminário Central da Bahia. Foi um dia bem diferente para os internos e para nós, que passamos o dia inteiro com o mano, abrilhantando a festinha deles, onde teve de tudo, desde comes-e-bebes, brincadeiras, palestras, jogos, danças, visita às dependências da casa e no final da tarde, a celebração eucarística.
No dia 14 (terça-feira) o Carlos almoçou aqui no Sodré, 305, em nossa casa, com a gente: eu, Luiza, Terezinha, Mary, Edlúcio e ainda nosso compadre Reginaldo e os amigos Josafá e Agnaldo. Faltou a Belinha que estava em lua-de-mel.
No Aeroporto: Chegamos lá às 17 horas. Carlos já estava, juntamente com seu colegas, o sr. bispo auxiliar D. Ângelo, o pe. Domingos - reitor do Seminário, e o pe. Luiz (este, viajará com o Carlos p/Roma). Depois chegaram o pe. Mathon e alguns legionários juvenis.
A emoção aumentava à medida que os minutos iam passando. Enquanto alguns choravam, outros conversavam, alguém fotografava, o Carlinhos, com a tranquilidade de sempre, ora tocava violão, ora passeava pra lá e pra cá com o Edlúcio. Aproveitou um" orelhão" e falou com o papai em Itamaraju. Foi gravada uma fita K-7 com mensagens de várias pessoas para ele. No final da fita, eu, Mary, Luiza e os legionários, cantamos a música "A Barca”, só que, chegando "lá na praia..." emocionada, parei de cantar. (a fita, colocamos na sacola p/ Carlos levá-la consigo).
Às 17:40, Carlos e o pe. Luiz despediram-se de todos e às 18 horas, lá estavam os dois, à porta do avião, acenando pra gente que, do terraço acenava também. Percebi naquele instante, em alguns olhares, uma lágrima, mas senti que, em todos, o pensamento era um só: Feliz viagem! que Deus os acompanhe! Até a volta:!
Agora, vamos aguardar sua primeira cartinha. ,
Salvador-Bahia, 16 de setembro de 1982.
1ª cartinha
PONTIFÍCIO COLÉGIO PIO BRASILEIRO
VIA AURELIA, 527 00165 ROMA - ITÁLIA
Roma, 19 de setembro de 1982.
Queridos pais, manos e amigos:
"La grazia del Signore Nostro Gesù Cristo sia con tutti voi".
Será mesmo que a saudade já está grande? Mas, grande ou pequena ela existirá no coração de quem ama. Alegrem-se agora, pois aqui vai minha primeira cartinha para vocês. Puxa como há tanta coisa a contar! E imagino o quanto vocês estão igualmente curiosos por saber estas notícias. Primeiramente falarei da viagem e depois de tudo mais.
Em ambos os voos - Salvador/Rio, Rio/Roma - tivemos uma viagem tranquila, porém,cheia de emoções para mim que viajo pela segunda vez de avião. Desta vez foi como se fosse a primeira, uma vez que já não guardo a emoção da primeira (Bahia/Alagoas, quando participei dos Jogos Estudantis Brasileiros, na disputa de Xadrez). O interessante para mim foi a aprendizagem de muita coisa, uma vez que eu estava super curioso por todos os detalhes.
No ‘aviãozinho' para o Rio foi tudo muito simples: fora o jantar, não se fazia outra coisa a não ser ler jornal, conversar com o vizinho, ou então, ficar calado observando o que se podia ver no interior do avião. Pela janelinha, só a escuridão. Já no avião da Alitalia (Rio/Roma) a coisa foi muito diferente, a começar pelo tamanho do avião. É por isso que escrevi o avião da Varig como ‘aviãozinho’ pois esse outro foi realmente enorme. O primeiro cabia cerca de 60 passageiros; esse outro, transportava, se não me engano, muito; quase uns trezentos! E era gente de toda parte do mundo: americanos, japoneses, italianos, ... Cada tipo! Cada vestimenta! Gente feia, gente bonita, magra, gorda, alta baixa,... e até crianças e bebês. Foi um bom momento para ir me acostumando com essa mistura de tantas línguas que estarei ouvindo por aqui. Esse segundo vôo teria se tornado bastante cansativo e chato não fosse a possibilidade que tínhamos de ouvir músicas (por um fone de ouvido, que podia variar a música através de 12 canais), e ainda um filme (esse nem assisti todo pois estava com um sono danado, terminei dormindo mesmo), e ainda mais o caminhar pelos corredores entre as cadeiras para ver as caras dos passageiros, ou então, dar uma chegadinha numa das janelinhas para olhar o exterior. Como a viagem durou cerca de 12 horas, somente de dia pudemos observar algo interessante pela janelinha. Para mim, gostei muito de ter visto a África com aquele sol quente e o terreno árido; isso quando o avião sobrevoava certa região da mesma. Naquele momento me lembrei de Edel Quinn, mas tinha certeza que aquela região não foi a mesma em que ela andou.
Outra coisa digna de nota é todo o sistema automático - por certo controlado por computadores - dos aeroportos internacionais: desde o controle do nome do passageiro, pela vistoria do passaporte, até o quadro de informações dos horários de cada vôo programado. No entanto tivemos uma pequena decepção no aeroporto daqui de Roma, pois não vistoriaram as nossas malas e nem ao menos houve alguém que se encarregasse de conferir o ticket para comprovar se nossas malas eram essas mesmas, como esperávamos que fizessem. Mas não. Quer dizer então: a gente podia pegar inclusive a mala de uma outra pessoa, e eles, igualmente as nossas. Mas, na verdade, cada um cuida do que é seu, isso sim. E quanto a vistoria, entendemos o porque depois: claro que, de 200 ou 300 passageiros que transitam pela saída num desses voos internacionais, seria realmente terrível e demorado ter que vistoriar todo mundo. O certo é que eles vistoriam qualquer um, por sorte ou por cara.
E a chegada com o frio? - Será que algum de vocês estão perguntando sobre isso? Imaginem: fazia calor! Temperatura em tomo de 26 graus. Durante o dia a temperatura tem sido a mesma durante esses dias, caindo um pouco à noite: está uma temperatura agradável. A explicação é que estamos de fato no verão europeu. Dizem que daqui pra frente vai começar a esfriar e, quando chegar o inverno mesmo, cada um que se agüente pois a temperatura pode cair abaixo de zero graus.
Quando chegamos aqui - falo no plural referindo-me a mim, ao Pe. Luiz Rodrigues que partiu de Salvador comigo e de mais outros dois que encontramos no Rio, vindo também da Bahia, no mesmo voo - aqui fomos recepcionados pelo padre Reitor do Colégio Pio Brasileiro e também por um colega baiano, o Ademar. / No aeroporto meu relógio marcava 12 horas (horário do Brasil) e no entanto, o horário local era 17 horas. Ou seja, no verão, Roma está com uma diferença de 5 horas a mais que o Brasil, porém no inverno essa diferença será reajustada para 4 horas. E assim, transportados no carro do Colégio desde o aeroporto, chegamos aqui já ao entardecer perto das 17:30 hs, no Pio Brasileiro.
Vou falar um pouco do Colégio, descrevendo um pouco a casa mas vocês só poderão ter uma ideia melhor depois que eu lhes enviar uma fotografia da mesma. Não lhes falarei do histórico da casa pois ainda não sei bem sobre a mesma. Direi, em linhas simples o que há aqui que possibilita a todos que aqui moramos uma vantagem e privilégio que não temos aí no Brasil, ao menos no Seminário ou em nossa casa. Na sua essência o Pio Brasileiro é um prolongamento do Seminário, em termos de formação de seminaristas e padres para a vida eclesial. Para isso a casa dispõe de um enorme prédio de 2 andares numa extensão gigantesca, formando um "H". Pra vocês terem uma ideia, o prédio mais o terreno com árvores e plantações pode ser comparada a uma grande praça, em dimensão. / Interiormente a casa possui: a) várias Capelas, distribuídas por andares; b) muitos dormitórios; c) Auditório; d) Sala de audições (discos, fitas, rádio); e) Sala de tv; f) Sala de leitura; g) 2 bibliotecas; h) uma capela principal, enorme; i) cozinha, refeitório, banheiros, etc, etc. Externamente, temos, um campo de futebol e uma quadra. Para recreação. temos ainda salas de ping-pong, totó e sinuca.
Quanto aos hábitos, costumes com relação à casa temos: horários certos para as refeições principais. Quanto a merenda, pode ser tomada em qualquer horário e cada um pode comer o que quiser, do que tiver na geladeira e no armário: leite, biscoitos, pão, doce, queijo. Nesta sala da merenda também usada para o café da manhã - há também um fogão, caso alguém queira fritar um ovo ou fazer um cafezinho, ou mesmo esquentar o leite.
As roupas pessoais, cada um tem que lavar a sua: a casa oferece a máquina e o ferro, numa sala própria. As roupas de cama, que pertencem à casa, é trocada quinzenalmente; e igualmente lavada pelas irmãs que servem aqui. Além das Irmãs, há os funcionários: muitos destes já moram aqui há mais de 15 anos.
Em nossa responsabilidade temos duas chaves: a do nosso quarto e uma outra que abre todas as portas que nos é permitido entrar ou sair, tais como, o portão de entrada e outras portas que nos permita entrar na casa (não só pela entrada principal) e outras salas internas.
Cada aluno ou padre residente possui uma conta onde são anotadas as despesas que fazemos na compra de objetos - tais como material escolar, selos, envelopes, xerox e que devemos pagar no fim do mês. Minha conta já está a mais de 100.000 Liras, pois que já comprei uma máquina de escrever e outros materiais, como, envelopes, papéis, etc. (Depois lhes falarei sobre a Lira, o dinheiro daqui), / Pra lhes falar da linguagem usada aqui no Pio, abrirei um outro parágrafo.
Posso dizer que me sinto mesmo ‘em casa', no que se refere ao idioma. O Colégio é brasileiro e então todo mundo fala o português, menos alguns funcionários e alguns padres vindos de outros países. Com estes últimos já tive até oportunidade de treinar um pouco o meu inglês. Tem acontecido que, nas mesas, às refeições, querendo perguntar-lhes alguma coisa ou dar-lhes alguma informação, o tenho feito no inglês, pois eles sabem o Italiano, e esse, estou começando a ‘engatinhar’ agora. Aliás, já entendo razoavelmente o que dizem em Italiano: o falar é que é difícil. Difícil porque não temos ainda todas as palavras necessárias de cor, ou seja, memorizadas para expressar o que queremos, a não ser que deixe algumas palavras no português. Por outro lado, pessoalmente, tenho ainda aquele acanhamento natural de falar noutra língua; mas, por isso, não tenho receio, pois nesses 5 dias que já passei aqui percebi que esse acanhamento está acabando. O certo é que aqui dá pra aprender o Italiano de uma forma mais intensiva e rápida pois, vejam bem: notícias de TV e filmes, conversações, músicas, letreiros, folhetos, bíblias, palavras cruzadas, revista em quadrinhos jornais... tudo em Italiano! Amanhã começará o curso intensivo de italiano aqui no Pio para os novatos. Assim temos apenas dez dias para "destruir" o Italiano, pois as aulas, que começarão em outubro próximo, são proferidas no idioma local. De minha parte não estou sentindo muita, dificuldade nesse ponto, uma vez que estou praticando continuamente. Daqui pra frente vou caprichar na cópia e leitura. Pra conversação tenho que aprender os termos do linguajar comum.
Quanto a mim, estou bem. Continuo com a mesma calma e estou me sentindo como se nada demais tivesse acontecido. Inclusive, já dei umas voltas pela cidade com os colegas e achei tudo normal. Até mesmo a praça de São Pedro, no Vaticano, não me emocionou profundamente. O espírito de curiosidade por tudo que o novo e belo, este sim, e que esteve atento esse tempo todo. Mas, enfim, a Brasília é extraordinariamente grande e bela. Outro dia vou voltar lá sozinho para explorar melhor os detalhes. Outro dia também lhes contarei mais sobre a mesma. Por enquanto contentem-se com os postais.
Quanto à cidade também não lhes posso falar muito, pois que não conheço nada ainda. Direi sobre alguns detalhes que achei interessante.
É difícil ver um Volks por aqui. Há um carrinho tão pequeno chamado cinquentinha que eu preferi batizá-lo com um novo nome: "Baratinha". O tamanho da "baratinha' é quase a metade de um volks.
Quanto ao trânsito, os pedestres têm vez nas faixas brancas, e também o número de motocicletas e lambretas é enorme.
Os ônibus são simplesmente numerados por linha. Os ônibus não tem cobrador: os passageiros compram os tickets-passagem nos bares e lanchonetes e ao subir ao ônibus deve registrá-lo numa máquina eletrônica existente em cada ônibus. Assim, o preço é fixo, servindo os tickets para qualquer ônibus. Preço: L200, ou seja, cerca de Cr$ 30,00. Há ainda, para os Ônibus coletivos, as chamadas “Tésseras”, um cartãozinho, mais caro, que dá direito ao passageiro viajar em qualquer ônibus quantas vezes queira durante um mês. / Fora os ônibus há ainda os trens e o metro.
Outra coisa interessantíssima é o sistema telefônico local: com uma ficha, a pessoa pode telefonar para outra durante o tempo que quiser, 3 minutos, 10, 20, meia- hora, um dia, fazendo uma ligação. Para ligações com outras cidades ou até internacionais, aí então deve-se colocar bastante fichas.
Quanto a televisão - pasmem! - há cerca de 40 canais. Emissoras de rádio há também uma porção, além de pegar nas ondas curtas as emissoras francesas, alemãs e outras.
No aspecto da alimentação, há muitas frutas, principalmente a uva, ameixa fresca, cereja e pêssego. A alimentação normalmente é farta e variada, aqui no Pio.
Quanto ao dinheiro, a Lira, tem seu valor 7 vezes abaixo do Cruzeiro. Enquanto no Brasil um Dólar custa Cr$200,00, aqui, um Dólar custa L 1.390 !!
Mas o custo de vida aqui, pelo menos é menor que aí no Brasil. Algumas coisas são relativamente caras, comparada com o Cruzeiro, mas, relativamente o poder aquisitivo do povo é maior. Por exemplo, um vendedor balconista recebe um salário mensal de L 500.000, o que equivale a cerca de Cr$70.000,00. E daí pra mais.
Outra coisa barata por aqui são os produtos eletrônicos, como rádio, gravadores, TVs.
Voltando ao assunto do Colégio, devo dizer que conheço uma parte da turma que mora aqui: são todos muito bacanas e tenho participado com eles, esses primeiros dias, de jogos, passeios, conversas, orações... e temos desde já uma convivência alegre e fraterna. No entanto outros mais virão quando estiver mais próximo das aulas. Claro que a maioria aqui são padres. De seminarista mesmo só há uns 12; os 30 restantes são padres.
Finalizando, quero mandar a todos vocês um grande abraço e vos dizer muito obrigado por tudo que vocês fizeram e contribuíram para que eu aqui estivesse agora. Quero vos lembrar ainda que não se esqueçam de mim em suas orações. Daqui, peço também ao Bom Jesus, por todos vós e estejam certos de que mandarei notícias sempre. Escrevam também, será uma alegria para mim e uma comunhão maior conosco.
Agradeço especialmente a todos vocês que me desejaram boa viagem e votos de que tudo corresse bem por aqui; aos que me deram a feliz surpresa de ouvi-los pessoalmente através duma gravação em fita - gravação essa que guardarei sempre comigo como recordação e para ouvi-la nos momentos em que a saudade apertar (Naqueles momentos em que nosso coração não bate: apanha) - e que, por tudo isso rendo graças ao nosso Criador que tanto nos ama e revela esse Amor nos pequenos gestos de cada criatura humana.
Convido agora todos vocês a rezarem comigo a oração que o Senhor nos ensinou:
"Padre nostro, che sei nei cieli, sia santificato il tuo nome; venga il tuo regno, sia fatta la tua volontà, como in cielo, così in terra. Dacci oggi il nostro pane quotidiano, e rimetti a noi i nostri debiti, come noi li rimettiamo ai nostri debitori e non ci indurre in tentazione, ma liberaci dal male.”
Que Maria Santíssima os abençoe e os guarde sob seu manto para que cresçam sempre mais no amor a Jesus e ao próximo.
Dêem lembranças a todos que perguntarem por mim. Ciao!
Carlos Eduardo da Silva
Veja mais fotos nos álbuns de CARLOS na Europa (1982-1986)
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